sábado, 6 de agosto de 2011

O Amor ao Próximo [Parte 1]

Esta é uma série de 3 postagens sobre: O Amor ao Próximo.



Um texto muito mal usado


Talvez o texto bíblico usado com mais freqüência para difundir a mensagem da auto-estima é: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Lv 19.18; Lc 10.27; Rm 13.9; Gl 5.14; Tg 2.8). Esse uso, porém, quase sempre envolve interpretações erradas. Mesmo nos dias de Jesus essa ordem era mal-entendida. Será que há conexão entre os antigos mal entendidos e os novos? O erro antigo girava em torno do termo "próximo", e foi denunciado por Jesus na parábola do Bom Samaritano (Lc 10.29-37). O erro moderno gira em torno do termo "como a ti mesmo". Em Lucas 10.25, um mestre da lei acabara de perguntar a Jesus o que era preciso fazer para herdar a vida eterna. De acordo com Lucas, a pergunta não era sincera. O mestre não estava à procura da vida eterna; ele queria pôr Jesus à prova. Sob o disfarce de uma pergunta pessoal, ele propôs a Jesus um enigma acadêmico, na esperança de enredá-lo em alguma contradição herética com o Antigo Testamento.

"E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o, e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? E ele lhe disse: Que está escrito na lei? Como lês? E, respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo. E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso, e viverás." (Lc 10.25-28)

Escravo das aparências

Agora o mestre da lei está em dificuldades. Ficou evidente para todos que ele já sabia a resposta à pergunta. Sua motivação ao fazê-la não era um desejo sincero de informação, mas o desejo de fazer Jesus cair numa armadilha. Sua duplicidade fora desmascarada. Agora todos podiam ver que ele fora insincero, hipócrita, culpado da injustiça do ludibrio. O que ele podia fazer? Fugir envergonhado como o apóstolo Pedro e chorar amargamente pelo seu pecado? Ou, assim como milhões de pessoas antes e depois dele, tentar salvar as aparências?

Ele, porém, querendo justificar-se a si mesmo (e aí vem o erro antigo ligado ao termo "próximo"), disse a Jesus: E quem é o meu próximo? (vv29)

Diante da ameaça à sua reputação e consideração de Si mesmo, o pecado da autojustificação brotou. O mestre da lei foi induzido a pensar que o problema não era sua indisposição orgulhosa para arrepender-se e obedecer, mas a ambigüidade da palavra "próximo". A pergunta: "Quem e o meu próximo?" era nada mais que um artifício para salvar as aparências. Por trás da pergunta do mestre da lei há um mal-entendido tão sério da ordem de Deus que Jesus nem se dispõe a respondê-la. Com freqüência entendemos a Palavra de Deus de modo errado não por causa de descuidos intelectuais inocentes ou falta de informação, mas por causa de uma profunda recusa a submeter-se às exigências de Deus. A pessoa que pretende dirigir seus próprios negócios, manter seu orgulho, granjear apreço e glória das demais pessoas, sempre distorcerá as palavras de Jesus de modo a obter apoio para sua própria auto-estima. O mal do coração humano precede e dá origem a muitas das nossas interpretações erradas da Bíblia aparentemente intelectuais. Outra maneira de fazer a pergunta do professor da lei poderia ser: "Mestre, quem eu não preciso amar? Quais grupos da nossa sociedade são exceções a este mandamento? Com certeza os romanos, opressores do povo escolhido de Deus; e seus lacaios desprezíveis, os cobradores de impostos; e esses samaritanos mestiços — certamente todos esses não estão incluídos no termo 'próximo'. Diga-me quem é meu próximo, Mestre, para que, ao examinar os vários candidatos ao meu amor, eu cuide de escolher apenas este".

A parábola que denuncia

Jesus não quer saber de responder diretamente — o que, na verdade, era impossível— a esse tipo de pergunta. Em vez disso, ele conta uma parábola.
Um homem, provavelmente judeu, viajava de Jerusalém para Jericó quando foi atacado por assaltantes. Roubaram e espancaram-no, e o deixaram meio morto à beira da estrada. Passou por ali primeiro um sacerdote, depois um levita. Ao verem o homem, passaram pelo outro lado da estrada. Então veio um samaritano, e quando ele viu o homem ferido, sentiu compaixão por ele. Aproximou-se e tratou dos seus ferimentos, usando seu próprio óleo e vinho. Depois o colocou sobre sua própria montaria, levou-o até uma estalagem e cuidou dele até o dia seguinte. Aí deu do seu próprio dinheiro ao dono da pensão, para que continuasse tomando conta do homem, dizendo que pararia novamente na volta da viagem, para cobrir a diferença, caso não tivesse sido suficiente.

Depois de contar a parábola, Jesus devolve a pergunta ao professor da lei:

—Na sua opinião, qual desses três foi o próximo do homem assaltado?
—Aquele que o socorreu — respondeu o professor da lei.
—Pois vá e faça a mesma coisa — disse Jesus.

O objetivo da parábola de Jesus foi mostrar que o pedido do professor para que definisse o termo "próximo" na verdade tinha a intenção de desviar a atenção do que realmente interessava: o tipo de gente que ele mesmo era. O problema do professor não era definir a palavra "próximo"; seu problema, como o de todo ser humano, era tornar-se o tipo de pessoa que, por causa da compaixão, não pode passar do outro lado da estrada. Nenhum coração verdadeiramente compassivo ou misericordioso pode ficar parado enquanto a mente examina se um candidato sofredor se encaixa na definição de próximo. Se o professor tivesse estado submisso à intenção do mandamento de Deus, teria visto como sua pergunta sobre seu próximo era irrelevante. A intenção de Deus é criar uma pessoa cheia de amor, compaixão e misericórdia, cujo coração a leve irresistivelmente à ação quando houver sofrimento no seu raio de alcance, uma pessoa que interrompa sua programação, arrisque passar vergonha, use seu óleo e vinho, reparta seu dinheiro para ajudar um estranho que sofre. Jesus diz: Torne-se essa pessoa, e você herdará a vida eterna; bem-aventurados são os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. É dessa maneira, então, que o mandamento "Ame o seu próximo como a Si mesmo" era entendido errado na época de Jesus e como Jesus reagiu a isso.

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Retirado de "Em Busca de Deus", John Piper













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